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Clima influencia proliferação de fungo e uva paulista amarga perdas acima 30% durante a colheita

Temperaturas entre 25 °C e 30 °C e alta umidade proveniente de chuva, orvalho, irrigação ou cerração são condições ideais

O Circuito das Frutas Paulista é uma área que engloba dez municípios de São Paulo com destaque na fruticultura. Mas, a região passa por um período preocupante com os pomares de uva.

Os vitinicultores estão perdendo suas produções pelo avanço da podridão da uva madura, doença causada pelo fungo Glomerella cingulata. O fungo encontrou condições ambientais favoráveis para se multiplicar nos vinhedos da região e, há pelo menos quatro anos, prejudica os vitivinicultores locais. Nesta última safra, no entanto, os danos provocados pelo patógeno chegaram a um nível sem precedentes, com perdas variando de 30% a até 100% da colheita.

“Essa não é uma doença desconhecida, mas, da forma como ela se deu neste ano, assustou muita gente. Alguns produtores até arrancaram o vinhedo inteiro, achando que não conseguiriam mais controlar de forma viável”, afirma Renê Tomasetto, presidente da Associação Agrícola de Jundiaí. Ele acredita que o fator climático favoreceu a multiplicação do fungo na região e ressalta que 2023 foi um ano atípico, marcado por chuvas acima da média, com precipitações na época de poda e da colheita, intercalada por períodos secos. Com umidade e temperaturas ideais, o fungo avançou de forma agressiva, vencendo a batalha para frear a sua propagação.

Impacto na agricultura regional

O município de onde chegam os relatos mais impactantes é Elias Fausto, localizado a cerca de 130 km da capital paulista. A doença comprometeu a produção inteira, enchendo as famílias de desesperança fazendo-as largar o trabalho no campo em busca de outros meios de sobrevivência.

Atalívio Rufino possui um sítio na cidade há 16 anos. Ele conta que 90% da uva foi comprometida pela Glomerella na produção no início do ano. O pouco que restou foi vendido, mas não foi capaz de equilibrar as finanças da família e que, por isso, teve de abrir mão de um empregado que os ajudava. Apesar do cenário desolador, ele decidiu não desistir e vai travar novos combates contra a podridão da uva madura. Ele pretende usar as reservas para investir em outras medidas de controle. “Conseguimos uma gordurinha com as vendas anteriores e por conta disso estamos conseguindo nos virar”, conta. A propriedade de Atalívio é uma das 13 selecionadas para os ensaios propostos.

No município de Itatiba, encontra-se a propriedade de Antônio Mingotte, um dos viticultores mais afetados na cidade. Ele relata que costumava colher 40 toneladas de uvas por hectare, mas, desde 2022, a Glomerella vem devastando suas quadras de uvas, provocando perdas gradativas que agora chegam a 90%. Convivendo com as parreiras desde a sua infância, ele diz ter se assustado com a escala de disseminação da Glomerella neste ano.

“Um alastramento da doença igual a deste ano, eu nunca vi na minha vida! É preciso controlar essa doença logo, senão não conseguiremos ter produção”, declara. Atualmente com mais de 12 mil pés de uva, ele conta que chegou a colher os frutos de uma quadra (talhão) e foi percebendo que todas estavam apodrecendo. “Não tinha condição de mandar para o mercado. Arranquei e joguei tudo dentro do mato”, disse.

Isso repercute diretamente no seu bolso. O dinheiro da venda da uva pagava os custos da produção e gerava renda para investimento na propriedade. “Este ano vou ficar sem investir no sítio. Até pensei em semear tomate para ver se consigo pagar as contas enquanto isso, mas não tenho como comprar adubo; um amigo ficou de me dar. Se continuar do jeito que está, eu vou ter que parar. Muita gente está parando. Jundiaí é conhecida como Terra da Uva. Vai acabar a uva?”, desabafa.

Anderson Tomazetto lidera uma propriedade onde o solo é ocupado pelo cultivo da uva há mais de 100 anos. Ele conta ter visto os primeiros sintomas da podridão da uva madura nas suas terras há quatro anos, mas, na época, não sentiu grandes prejuízos. Buscando orientações técnicas da Embrapa, ele mudou o manejo e conseguiu bons resultados.

Foto: Alan Rodrigues – efeito da doença no sítio do produtor Ademir Minjoni

“Passei a levar o galho, os cachos infectados, e até uva doente colocava num baldinho em separado e levava para fora da quadra. Também apliquei calda sulfocáustica quando acabou a safra. É uma sequência de tratamentos associados a práticas de manejo. Se não fizer os dois juntos, não dará resultados”, ensina. Tomazetto considera o combate ao fungo como o maior desafio do viticultor. “O fungo é algo que não vemos, e na hora que percebemos, a planta já está contaminada”, diz.

Conheça a doença

Causada pelo fungo Glomerella cingulata, a podridão da uva madura provoca manchas circulares marrom-avermelhadas sobre o fruto, que posteriormente, atingem todo o cacho, deixando a uva escura e murcha. Temperaturas entre 25 °C e 30 °C e alta umidade proveniente de chuva, orvalho, irrigação ou cerração são condições ideais para a esporulação, disseminação, infecção e o desenvolvimento da doença.

Plano de controle

Na Câmara Setorial de Uva e Vinho do Estado de São Paulo, a Associação Agrícola de Jundiaí apresentou à Embrapa uma demanda por medidas para reduzir a pressão da doença e, se possível, erradicar. Foi traçado um Plano Emergencial de Controle à Podridão da Uva Madura em auxílio aos vitivinicultores paulistas.

A primeira fase do Plano consiste na seleção de produtores receptivos à instalação de ensaios de controle da podridão da uva madura. Esse material será levado para o Laboratório de Fitopatologia da Embrapa Uva e Vinho, onde se desenvolverá a etapa seguinte, visando ao isolamento do patógeno, a sua identificação por meio da morfologia e testes para detectar a presença de isolados resistentes a determinados grupos de fungicidas.

Serão duas linhas de enfrentamento: nesse primeiro momento, serão visitados alguns vinhedos para mitigar as causas que contribuíram para a epidemia da doença na região e corrigir algumas práticas adotadas pelos produtores. Depois, a médio prazo, vem a adoção dos melhores produtos e práticas, que serão estudadas ao longo dessas duas safras, de tal forma que se torne um protocolo rotineiro”, explica o pesquisador Lucas Garrido, da Embrapa.

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